O grupo “Interpretar e Aprender” surgiu como ideia nos corredores da Universidade de São Paulo por três estudantes de História interessados em integrar diversão e aprendizagem. Apaixonados tanto por narrativas fantásticas quanto pelo ato de ensinar, estes amigos decidiram criar um grupo cujo intuito seria trabalhar, de forma prazerosa, os conteúdos escolares - e não haveria melhor maneira de fazê-lo do que utilizando o RPG, ou Role Playing Game.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Sobre vencer

No futuro, um dia, alguém vai olhar para trás e dizer: "Eu acho que no século XXI as pessoas eram telapatas. Há um documento que comprova isso". E quase todos vão concordar, mas há, e todos sabemos de sua existência, aqueles dentre os homens que são povoados pela dúvida acima de tudo. Mesmo sabendo a verdade, esses seres duvidantes ainda questionarão: "Mas como pode ser isso? Se as mentes não se unem e se os homens são todos um só e, ainda assim, cada um, um indivíduo." O fundamento do pensamento crítico é o questionamento, sistemático de toda forma que no tempo se transforma em símbolo. Buscando sempre a natureza externa a percepção humana, a verdade.

No futuro as pessoas questionarão muito, estou certo. Tudo estará à mira de nossas perguntas. Respostas às vezes são menos úteis do que as perguntas. "Que documento pode existir daquilo que nunca foi?" Perguntarão os incrédulos, sabendo da verdade. Todos sairão de cena, as luzes irão baixar e um filme passará. Onde? Essa é a pergunta errada, perguntas erradas levam a respostas equivocadas.


Assim é Pina de Wim Wenders: um elogio à dança em que ninguém precisa falar. As coreografias de Pina Bausch são reinterpretadas por uma trupe de dançarinos amigos da coreógrafa. Em cena, pouco se usam as vozes, o som nasce gutural e animalesco. Todos os exemplares dançarinos da companhia narram a vontade sobre a presença desta mulher. Retratada neste filme com respeito  e reverência. Pina Bausch é uma vanguarda avançada no tempo. Síntese de sentimento em gesto e depois em dança. Nunca um dançarino fala à câmera, apenas os personagens podem falar diretamente com o público, os dançarinos e seus relatos são apresentados separadamente, como se a narrativa fosse um som em off, um pensamento. Telepatas para nosso futuro.

O cinema é isso hoje: um recorte fotográfico capaz de emular sensações complexas com imagens e sons. A importante sensação de movimento da modernidade... Você não precisa visitar autores clássicos, nem cinema iraniano ou qualquer coisa cool que esteja na moda hoje para entender esse comentário. 

Veja Pina, filme em que o diretor Wim Wenders propõe-se explicar a obra em dança da coreógrafa. A movimentação da câmera, os cortes e recortes que unem cenários diferentes são todos elementos pensados para conseguir aproximar alguém sentado em uma poltrona entender como o corpus da dança se constrói para e a partir da proposta de Pina Bausch. Você consegue entender isso depois de assistir esse filme?

Todo mundo consegue. Basta desenvolver uma espécie de instinto que a maioria dos mamíferos mantém entre si: empatia. A capacidade de colocar-se no lugar do outro, instinto primordial que a nossa sociedade não aprova muito. Em um mundo onde EU impero sobre todas as coisas, onde EU tenho de vencer, porque se eu perder eu não vou ter acesso ao que EU quero. Olhar para o lado é uma atitude inútil e estúpida, eu sei. E sim, é isso que me parece que devemos ser agora: estúpidos e inúteis, mas ajudando uns aos outros. Acho que esse pensamento romântico não nasceu em mim. Ele nasceu para mim em um filme de 2000 chamado A corrente do bem. Levei anos para decantar essa lição bonita. Alguém morre no final. Algumas pessoas são boas, outras são ruins. Eu sou um pouco dos dois então contei o final mas sem contar de verdade provando meu ponto.

Sabe, eu penso muito sobre o que é o tempo. 'Qual é matéria dos dias?' é minha atual questão-problema. Talvez você concorde comigo que: ainda que tudo seja atravessado pelo tempo este elemento estranho ao mundo não tem materialidade em si. Mas o que isso tem a ver com Pina, Wim Wenders ou A corrente do bem? Como eu já explorei em outro post (o qual pode ser lido aqui) penso que hoje o capitalismo se propõe como algo mais que pura ideologia. Não existe oposição à este sistema, nem no pensamento, nem na memória, nem no imaginário humano atual. Sendo assim, não me parece haver um adversário a ser vencido, um modelo alternativo. Agora resta ao macro-sistema absorver as mentes dos indivíduos, mídia de massa colocada no centro de nossas imaginações. Em breve, não sonharemos mais com o futuro distante, onde os homens vivem nas estrelas: o cinema nos mostrará isso. Pior, o cinema nos mostrará como devemos imaginar. Filmes como A corrente do bem apontam tanto para a mídia de massa, quanto para o pensamento crítico. Autores como Wim Wenders cedem menos à proposta de síntese de avaliação enquanto dinheiro: significando que Wim Wenders abre mão de uma parcela do público (dinheiro arrecadado em bilheteria) para expor, apresentar sua obra como ele a imaginou. O diretor não cede diante de produtores que lhe prometem fortunas e mantém a afirmação da importância da imaginação ativa.

O RPG também subverte essa lógica social em que apenas um pode vencer. A bem da verdade este 'joguinho' elimina a ideia de vitória com final feliz: os sacrifícios do jogador em detrimento do personagem; a irmandade (por vezes beligerante dentro do grupo) forjada à imaginação, suor e sangue entre os jogadores; a superação dispensários propostos pelo mestre; são provas de que as pequenas vitórias dos personagens são muito menores do que a história que mestre e jogadores escreveram juntos. Eu já vi até jogadores iniciantes comentarem: "com esse jogo eu aprendi que eu posso morrer a qualquer momento", não acho que a menina de doze anos comentava com poesia a fragilidade da vida humana e sei que esta aprendiz de uma escola paulista onde aplicamos o jogo estava sorridente ao dizer uma frase tão forte como esta. Como diria o filósofo francês Albert Camus "É preciso ver o Sísifo sorrindo ao executar sua tarefa vã".

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Jogando com a História

É com muito orgulho que o I&A apresenta sua primeira participação em uma publicação, clique aqui para conferir!



Já contamos o que rolou aqui no blog, mas agora além do debate incrível entre nós, a Jaqueline e o Rafael da Universidade de Uberlândia, a edição especial da revista anual Mais Dados traz os trabalhos que suscitaram a conversa.

O preço, bem módico, é totalmente revertido para o custeamento da ONG Narrativas da Imaginação, que apóia o RPG no Brasil todo.

Quem se interessar e quiser ajudar ainda mais, ao incentivar o financiamento coletivo da ONG, as três edições da revista estão inclusas, além de outras tantas vantagens, como livros e cursos!